sexta-feira, 3 de junho de 2011

Ver-o-peso 384 anos no imaginário paraense




Foto: Igor Mota
 
Em 2011, o Ver-o-Peso completou 384 anos de existência, ainda com o título de principal cartão postal de Belém. São quase quatro séculos presente no imaginário do paraense. Mais do que a face de Belém, o complexo do Ver-o-Peso é uma mistura dos mais variados personagens do cotidiano da cidade, por meio das mais distintas relações de trabalho e sabedoria.



É o pescador que chega antes do amanhecer para abastecer as feiras e supermercados da capital, o vendedor que compra o pescado para revender ali mesmo, na pedra do Ver-o-Peso ou no Mercado de Ferro; o dono da banca que fornece o peixe frito na feira, junto com o açaí que vem das ilhas e é distribuído para toda a Região Metropolitana. Em meio a todo esse movimento, estão as vendedoras de ervas, que fornecem sabedoria popular, junto com banhos e perfumes para atrair sorte, casamentos, prosperidade e saúde.

É esta a economia que circula pelo Ver-o-Peso e que despertou a atenção da antropóloga Wilma Leitão, da Universidade Federal do Pará (UFPA), "O Ver-o-Peso é o mundo do trabalho, não somente porque funciona 24 horas por dia, durante o ano inteiro, como também por apresentar diferentes relações de trabalho", frisou a pesquisadora. Ela reuniu em um livro, intitulado 'Ver-o- Peso: Estudos antropológicos no mercado de Belém', a produção intelectual de diversos pesquisadores que voltaram os seus estudos para o principal cartão postal de Belém.

"O Ver-o-Peso é um campo de estudos que sintetiza a felicidade para sociólogos e antropólogos. Nele podemos estudar os aspectos religiosos, políticos, sociais e culturais", apontou. Apesar de ser o cartão postal que mais traduz a face de Belém, a pesquisadora prefere não afirmar que todo belenense conhece o Ver-o-Peso. "O Ver-o-Peso está completamente no imaginário do belenense, mas isto não significa que todos os que morem em nossa cidade conhecem os componentes do Ver-o-Peso, que são as frutas, as ervas, os cheiros, os sabores; tudo o que define os nossos produtos regionais".

Neste sentido, o Ver-o-Peso serve de objeto de estudo por concentrar num único universo regional produtos, costumes, formas de falar, de se cumprimentar, de negociar e se relacionar. "Tudo o que o pesquisador quiser tem ali", brincou Wilma.

Para ela, o que difere o Ver-o-Peso das demais feiras livres que existem na América Latina não é a sua dimensão, e sim o hábito e os costumes que nele existem. "Uma característica bem comum é a prática de se falar que os produtos vendidos no Ver-o-Peso são os de melhor qualidade", observou.

Esta pratica fortalece a confiança entre consumidor e feirante. "O consumidor que frequenta o Ver-o-Peso é habitual. Ele vai sempre lá. Praticamente só compra no Ver-o-Peso". No aspecto da geração de renda - uma das particularidades levantada pela antropóloga - o Ver-o-Peso apresenta uma característica bem peculiar, que é a relação entre renda e escolaridade dos feirantes. "Muitas pessoas acreditam que aqueles trabalhadores estão ali porque não tem estudo. De fato, podem até não ter, mas no final do mês, se a gente for perceber, a renda deles é tão igual, muitas vezes superior, a de quem tem graduação. Querendo ou não, isto é uma particularidade", analisou.

Por atender as necessidades de vendedores, consumidores e comerciantes, o Veropa, como também é chamada a feira livre, consegue se autorregular diariamente. "Um exemplo disto são as erveiras, que às vezes compram de mateiros e depois vendem para o consumidor direto e até para comerciantes", observou.

Quanto ao artesanato vendido na feira do Ver-o-Peso, poucos são para consumidores. "Os produtos artesanais são vendidos para outros artesãos, que revendem o que encontram ao recorrer ao Ver-o-Peso para ter matéria-prima", comentou Leitão.

Figuras
Neste cenário de autorregulação, relações socioeconômicas de hábitos e culturas, Wilma Leitão chama atenção entre os personagens que circulam diariamente pela feira do Ver-o-Peso. Um deles é o carregador, figura que, para a antropóloga, é conhecedora de técnicas e que transita por entre os mais diversos atores sociais. "O carregador tem um papel fundamental para o abastecimento das barracas, além disso, serve aos consumidores. São trabalhadores que exercem um cargo de confiança tanto do peixeiro quanto do consumidor", ressaltou.

Outro personagem é o feirante, cuja paixão pelo local de trabalho se destaca. "É comum a gente encontrar feirantes que dizem que o Ver-o-Peso é a vida deles. Com o que ganham lá, sustentam os filhos. Aprenderam com os pais a trabalhar na feira e hoje ensinam os filhos", comprovou Wilma.
Outro personagem é a pessoa que vai regularmente à feira, e que ajuda aquele espaço a se renovar dia e noite.

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